sabato 11 maggio 2019

13. Lobas

Acabo de ver uma publicação no Instagram da Tati Bernardi: “É muita mãe pra pouco Freud” - ta aí uma verdade verdadeira. A Tatinha (gosto tanto dela que, para mim, somos íntimas!) devia estar pensando na mãe dela, mas tomo a liberdade de roubar a referência. Dá para teorizar sobre esse amor? Até o pai da psicanálise teve seus trancos e barrancos e cá estou eu ousando escrever sobre a maternagem. 

Aceito minha limitação acadêmica e me direciono apenas a ela: a minha mãe. Sobre ela tenho maestria. 

Moro na Itália. Antes disso, morei no Brasil. E antes ainda, morei em seu útero. Essa mulher virtuosa não me planejou, mas me amou desde o primeiro exame. Me quis menina mesmo acreditando que eu viria com pipi (talvez também por isso eu seja toda metida a fálica!). Me esperou com entusiasmo e um tanto de preocupações. Me encheu de amor, me forçou comida, cuidou com mãos de fada, gritou como uma louca… Me vestia como uma princesa, mas me fazia um cabelo horroroso de coqueiro. Me penteava com o carinho dos anjos, embora certa vez tenha cortado minha franja de modo tão torto que virei o Jim Carey em “Debi e Lóide”. Foi perfeitamente ambivalente como qualquer ser humano que se preze. Fez tudo o que pode por mim e meu irmão na juventude dos seus trinta anos… e como fez bem! A danada é ariana cor de carmim e sempre soube nos dar amor e limite na mesma intensidade de seu fogo materno. O abraço e a bronca vinham queimando num braseiro de afeto. Que bom, calor não nos faltou.

Às vezes - como qualquer ser humano que se preze - relata culpa. Mães são culpadas quase por definição. Vi isso na clínica, na Bíblia, nos parques, nos ventres… É como se o erro e a maternidade não pudessem caminhar lado a lado. Como se o poder divino de gerar vidas fosse inconciliável com a errância humana. Quem inventou isso?

Gosto da concepção francesa “Il n’y a pas de mère parfaite”*. Com essa simples frase, as mães parisienses vão consolando umas às outras e dizendo a si mesmas que está tudo bem falhar. Não sei quem escanquestou que parir anulava a nossa condição de seres castrados. Aliás, eu sei. Fomos nós neuroticamente.

A Deusa sabe o que faz. (No dia das mães, nada mais justo que reverenciar a faceta feminina da divindade, não?)

Pois vos digo mais: as Deusas topam os crimes! Quem não topamos somos nós. No Antigo Egito (e até hoje por todas as partes do mundo greco-romano) se honra Ísis, a maravilhosa Deusa da maternidade e de fertilidade. Amo! Ísis era considerada um exemplo de mãe e esposa, era amiga de todo mundo, protegia até os inimigos e ajudava a galera do sub-mundo. Em contrapartida, copulou com o próprio irmão e lhe deu um herdeiro para vingar a sua morte. Fala se não era uma fanfarrona? Acho fantástico. Decidi bordá-la para homenagear minha mãe e toda a humanidade inerente às mães imperfeitas...e ainda assim sublimes. Como Ísis.




Calm down! Isso não é uma apologia ao incesto! Continuo sendo psicanalista e considero muito desejável que nossa cultura continue obedecendo uma Lei (que, em nossa civilização, se apoia no Tabu do Incesto) e acho ótimo. Furar isso seria perversão e estaríamos fadados aos caos. O ponto é que pecado e vingança são aspectos essencialmente humanos e Ísis, ainda que divina, comporta toda a nossa transgressão sem perder a paz. Por que então nossas mães terráqueas deveriam perdê-la?

Caminhemos em direção ao ocidente. A fundação de Roma, segundo a lenda mitológica, tem como participantes os irmãos gêmeos Rômulo e Remo que, após terem sido abandonados no rio Tibre, foram salvos por uma loba que os amamentou, mantendo-os vivos. Há alguns registros que defendem que a supracitada loba foi, na história real, sua mãe adotiva humana, já que o termo loba (em latim lupa) também era utilizado em sentido pejorativo para as prostitutas da época. 



Ou seja, a mãe poderosíssima e co-responsável pela fundação do maior império de todos os tempos teria sido ao mesmo tempo: animal, humana, mãe e puta. E vocês aí com complexo de culpa! Preocupadinhas com perfeição...

Esse texto é para todas as mães com seus úteros divinos e mãos pecaminosas. Para toda a dualidade maravilhosamente humana que há em nós mulheres. E é sobretudo para a minha mãe...

Minha fada, morar longe de você é sentir saudade frequente dos nossos erros e acertos. É te amar por tudo que você foi, é e continua sendo. Obrigada pelo acolhimento do útero e obrigada mil vezes mais pela expulsão do nascimento. Sem teu ventre abençoado eu não teria adquirido a força para explorar o mundo. Il n’y a pas de mère parfaite. Mas tem você, que é perfeita… mesmo sendo ariana! 

Buona festa della mamma!

*Il n'y a pas de mère parfaite: Não existe mãe perfeita



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